istmo

Cinco letras, dois vertical, terra que liga uma península ao continente…

No desconforto do encosto do corpo à roupa molhada, veio unir-se num cerco o frio. As mãos aninham-se nos bolsos, procuram um consolo que ande escondido. E então surge a fome, rainha e senhora das necessidades, à sua frente encabeçando o desfile caminha um grande lobo, rosna um vazio dentro do estômago.

Aqui te pilho, além te ganfo… murmurava para a companhia de botões sentinelas apertados nas guaritas de fazenda. Cortei por uma viela de arcadas escuras e cantos de mijo, aberta para uma outra rua mais ampla de margens arborizadas, entre edifícios compactos de casas vazias, lojas abandonadas. Na leve inclinação da estrada, alcandorada de um semáforo preguiçoso, o carro dela não se movia. Iluminada a rubro distinguia a porta ligeiramente aberta, cabeça de fora, cabelo caindo a direito, espectador da boca que vomita. Acelero o passo, quase em corrida, uma dor antiga regressa ao joelho esquerdo, o ar frio fere os pulmões, respira pelo nariz, digo para mim.
Um carro de faróis amarelos cruza a mesma rua parando um pouco mais abaixo, dois vultos apressados deixam o seu interior, caminham para ela.

Respira devagar, dizia, acalma-te… já chamaram a ambulância. O ar falhava-me, entrava a miúde, queria parecer forte, mas as dores condensavam-se em volta do peito, os olhos enchiam-se de névoa. As palavras não se formavam, não conseguia perguntar se ela estava bem, o céu da boca deslocava-se, um bolo de sangue crescia sobre a língua. Naquela espera que pareceu interminável, o rosto doce melancólico, em que eu mal reparara, apoderou-se do meu destino, entreguei-lhe sem palavras todos os meus dias. Na manhã seguinte faltou às aulas e visitou-me, trazia uma caixa de raivas e um vestido azul. Uma semana depois casamos.

Um descompasso agita o bater que nasce no peito, a chuva brade-me ao ouvido, corre, corre o mais que puderes…

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